domingo, 31 de março de 2013

Quaresma e Jejum no Espiritismo



Um amigo escreveu-nos, perguntando como nós espíritas nos comportamos no período de Quaresma, se também fazemos jejum como fazem algumas religiões.

O profundo respeito pelas religiões integra as diretrizes doutrinárias do Espiritismo, o que está de acordo com as disposições da nossa Constituição Federal. Com isto deixamos claro que vamos expor a posição da Doutrina Espírita em face do que nos foi perguntado, sem quaisquer laivos de críticas a esta ou aquela religião.

Quaresma é o período de 40 dias que vai da quarta-feira de cinzas até o domingo de Páscoa, sem inclusão dos domingos na contagem. Os religiosos que a reverenciam, católicos e anglicanos, praticam o jejum de carne no primeiro dia e na sexta-feira da paixão.

Segundo o dicionário de Aurélio os 40 dias são dedicados a penitências. O Site Wikipédia informa que, essencialmente, o período é um retiro espiritual voltado à reflexão, onde os religiosos se recolhem em oração e penitência para preparar o espírito para a acolhida do Cristo Vivo, Ressuscitado no Domingo de Páscoa.

O Espiritismo possui uma estrutura doutrinária própria, assenta-se num conjunto de princípios fundamentais e está exposto nas suas obras básicas e complementares. A sua prática não admite rituais, paramentos, ou utilização de símbolos e imagens. O seu culto é o interno, significando que o seu adepto deve realizar a autotransformação pelo esforço diuturno de domar as más inclinações, de abandonar vícios morais e materiais, adotando como código de conduta as regras morais reveladas por Jesus.

Na parábola do Bom Samaritano (Lc, 10:25-37) Jesus instrui um Doutor da Lei, que lhe pergunta sobre o que fazer para se ganhar a vida eterna. De forma resumida foi esta a resposta do Cristo: para ganhar a vida eterna vá e faça da mesma maneira como fez o Bom Samaritano.

O que fez o Bom Samaritano?

Consta da parábola que o mesmo praticou, por amor verdadeiro ao próximo, a caridade moral e material de maneira incondicional, completa, sem medir esforços, diante de um homem que fora encontrado meio morto, após assaltado e espancado.

Antes da atitude bondosa do Samaritano, um sacerdote e um levita (auxiliar do templo) passaram pelo homem caído e não lhe deram a mínima importância. Por quê? Possivelmente porque já haviam cumprido os deveres diários para com Deus nos rituais do Templo, porque eram insensíveis ante a dor alheia ou porque amar e ajudar o próximo não constituíssem atividades observadas por sua religião.

O Samaritano, homem comum da Samaria, foi justamente quem praticou a Lei Maior: “amar o próximo como a si mesmo”, que, segundo Jesus, é equivalente a “amar a Deus sobre todas as coisas”.

Portanto Jesus propõe que para se alcançar a felicidade e a plenitude da paz o homem deve praticar o amor e a caridade em toda sua extensão, que são antídotos irresistíveis no combate às deficiências morais, como egoísmo, orgulho, vaidade, ódio, ambição, ou por outra, deve fazer jejum (abster-se) desses vícios que são os reais causadores das desgraças da Terra. Este deve ser o sentido verdadeiro de Jejum e, não, o de abster-se da ingestão de carne porque, em outra passagem do Evangelho, Jesus ensina:

“Não é o que entra pela boca que torna o homem impuro. O que sai da boca do homem é que o macula. O que sai da boca procede do coração e é o que torna impuro o homem: porquanto do coração é que partem os maus pensamentos, os assassínios, os adultérios, as fornicações, os latrocínios, as maledicências...” (Mt. 15:1-20).

O esforço de combate às más tendências deve se estender por todos os dias, semanas e meses do ano. “Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más”. (Allan Kardec, Evangelho Segundo o Espiritismo – Cap. XVII, item 4).

Quanto ao consumo de carne, a Doutrina Espírita prescreve que em nosso atual estágio, a carne alimenta a carne, e que o homem tem necessidade de alimentar-se conforme reclame a sua organização (Questão 723, do Livro dos Espíritos), mas sem necessidade de abusar desse direito (Questão 734, Idem).

Entendemos que, com o progresso moral, a humanidade chegará a um ponto em que não terá mais necessidade de alimentar-se dos invólucros carnais dos animais, não só por amor a eles, como porque a tecnologia lhe oferecerá sucedâneos adequados à sua organização física. Alguém inclusive já disse, e com muito acerto, que “o homem não se torna bom porque deixa de comer carne, mas quando ele se torna bom, deixa naturalmente de ingeri-la”.

Osvaldo Ourives

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